ASPECTOS HISTÓRICOS DA INTRODUÇÃO DO CAFEEIRO NO CERRADO
Paccelli M. Zahler
O café, além da sua importância como produto de exportação em muitos países tropicais, é a principal planta utilizada como bebida no mundo, devido às suas propriedades estimulantes (HEISER Jr., 1977). Suas folhas têm sido utilizadas na forma de banhos, com reconhecidas propriedades terapêuticas (CRUZ, 1982).
Originário da região de Kaffa, na Etiópia (CRUZ, 1982), foi introduzido no Iêmen, provavelmente pelos árabes, no início do século dezessete (BORIN, 1971). Foi levado em 1690 para a Ilha de Java pelos holandeses, os quais, em 1706, enviaram mudas para o Jardim Botânico de Amsterdam (JOLY e LEITÃO FILHO, 1979). Em 1713, mudas destes pés foram levadas para o Jardim de Plantas de Paris e, suas sementes, enviadas para a Martinica, passando dali para os países da América Central e Colômbia (CAMARGO e TELLES Jr., 1953).
Em 1714, os holandeses levaram para a Guiana Holandesa (atual Suriname) sementes dos cafeeiros do Jardim Botânico de Amsterdam, passando dali para a Guiana Francesa, em 1718, sendo cultivadas nas proximidades de Caiena, sua capital.
Foi introduzido no Brasil em 1727, através de mudas trazidas de Caiena pelo sargento-mor Francisco de Mello Palheta (TOURINHO, 1962; BORIN, 1971), que para lá havia sido enviado em missão oficial. No mesmo ano, foi cultivado nas proximidades de Belém e, nos anos que se seguiram, seu cultivo estendeu-se a outros Estados, chegando, em 1774, a Goiás; e, um ano depois, a Minas Gerais. Em 1830, já haviam grandes cultivos em São Paulo, no Vale do Paraíba.
Com a consolidação da Revolução Industrial, no início do século dezenove, os países europeus puderam ampliar seus investimentos, ao mesmo tempo em que foi aumentado o consumo de bens até então considerados de luxo, como o café.
Separado de Portugal e sem possibilidades de investir na industrialização, o Brasil passou a se dedicar à exploração agrícola. O café, que até esse período não tinha muita expressão econômica, sendo inclusive utilizado como planta ornamental, passou a exercer um papel importante na economia brasileira. Mesmo atravessando algumas crises, a pior delas em 1930, quando o mercado internacional deixou de comprá-lo, tendo sido necessário queimar alguns estoques para que o preço fosse mantido (LOBO, 1967; ARRUDA, 1974) o café permaneceu como um dos nossos principais produtos de exportação.
Dentre as 120 espécies do gênero Coffea (CARVALHO, 1954), destacam-se o Café Arábica (Coffea arabica) e o Café Canefora (Coffea canephora), em especial, o Café Robusta (Coffea canephora var. robusta) (JACQUES-FÉLIX, 1968), responsáveis por 98% da produção mundial, sendo ainda cultivados cafés de menor expressão como o Coffea liberica e o Coffea abeokutae (BORIN, 1971).
O Café Arábica possui um número muito grande de variedades, as quais, dependendo do método de colheita, tratamento dos frutos colhidos e condições climáticas da região, produzem uma bebida de fina qualidade.
A mais antiga variedade de Café Arábica introduzida no Brasil foi a typica (Coffea arabica var. typica Cramer, 1913), conhecida regionalmente pelos nomes de Café Comum, Nacional, Brasil, Crioulo ou Sumatra (KRUG et al., 1938), tendo sido considerada pelo Instituto Agronômico de Campinas – IAC como o tipo padrão nos estudos de taxonomia e genética (CARVALHO, 1954). Sua anatomia foi estudada para servir de base de comparação com outras variedades de café (DEDECCA, 1957).
Mais tarde, como produto de um programa de melhoramento genético do Instituto Agronômico de Campinas – IAC, surgiu o Café Catuaí (Coffea arabica cv. catuai), o qual, em condições controladas, apresentou uma produção semelhante à do Café Mundo Novo (SÖNDAHL et. al., 1976), que tem predominado na maioria das culturas brasileiras por sua excelente capacidade produtiva (JOLY e LEITÃO FILHO, 1979).
De um modo geral, a cultura do café tem apresentado problemas de baixa produtividade no Brasil, em relação ao que é alcançado em outro países (BORIN, 1971) e isso se deve a diversos fatores, tanto de manejo como ambientais e genéticos. Para conhecer e encontrar soluções para tais problemas estão sendo feitos estudos de taxonomia, citologia, fisiologia, melhoramento genético e manejo dos diversos cultivares, os quais têm contribuído para a obtenção de novos cultivares geneticamente capazes de reagir ao ambiente onde se desenvolvem (ANTUNES FILHO, 1954). Entretanto, em condições de campo, o potencial genético nem sempre consegue se manifestar com eficiência, devido às diferenças entre os indivíduos da mesma espécie ou fato de que o cultivar foi selecionado e estabelecido em diferentes condições ambientais. Isso faz com que se adaptem melhor que outros em determinadas condições ambientais (MEDINA, 1977).
Em 1974, a Cooperativa Agrícola de Cotia – Cooperativa Central (CAC-CC), com a colaboração de entidades federais e estaduais, passou a executar o Programa de Assentamento Dirigido do Alto Paranaíba (PADAP), no cerrado do Alto Paranaíba, em Minas Gerais, para cerca de noventa associados, dando-lhes assistência nas culturas de soja, trigo e café (CASTRO, 1979). Nos primeiros plantios, empregou-se o Café Mundo Novo e, mais tarde, o Café Catuaí, que se mostrou bastante produtivo naquelas condições (Café..., 1980).
No Distrito Federal, o Centro de Pesquisa Agropecuária dos Cerrados (CPAC-EMBRAPA), em 1984, possuía uma plantação com diferentes cultivares de café, onde o Catuaí, além de ser mais produtivo, mostrava-se resistente às principais doenças do cafeeiro (Engº Agrº João Batista Ravaes Sampaio, informações pessoais dadas em 1984).
Na Fazenda Água Limpa da Universidade de Brasília – UnB, havia um experimento de concorrência de cultivares, instalado em 1977, conduzido pelo Prof. Joachim von Büllow, do Departamento de Agronomia, onde o Café Catuaí, mostrava-se mais produtivo em relação aos cultivares Icatu e Mundo Novo, além de apresentar características agronômicas mais desejáveis que o cultivar Mundo Novo, como: menor exigência quanto à fertilidade do solo; menor queda de frutos por agentes mecânicos (chuvas, granizo, ventos, capina e pulverizações); boa formação da saia, dificultando a incidência de ervas daninhas e mantendo o solo mais protegido; porte baixo e maior resistência às doenças (Café..., 1980).
Por outro lado, apresentava suscetibilidade ao bicho-mineiro (Perileucoptera coffeella Guérin-Meéville, 1842), ao ácaro vermelho (Oligonychus ilicis McGregor, 1919) e à ferrugem do cafeeiro (Hemileia vastatrix Berk. E Br., 1968) (CARVALHO et. al., 1979), o que ainda não havia sido observado no Distrito Federal (Engº Agrº João Batista Ravaes Sampaio, CPAC-EMBRAPA, informações pessoais dadas em 1984).
Tais observações de campo faziam do Café Catuaí um cultivar promissor nas condições ambientais do cerrado, particularmente, do Distrito Federal, onde o clima é tropical, mesotérmico, úmido, com seca no inverno e chuva no verão (tipo Cwa, da classificação de Köppen), e áreas com altitudes superiores a 800 metros, tornando-o climaticamente apto à cafeicultura (BRASIL, 1981) que, em 1989, ocupava o segundo lugar em área colhida entre os cultivos permanentes da região (CODEPLAN, 1989) e,segundo o IBGE (2007), em 1996, era cultivado em 2.887 hectares, com um valor de produção de pouco mais de 1 milhão de reais.
BIBLIOGRAFIA
ANTUNES FILHO, H. Melhoramento do cafeeiro – II – projetos em execução no Instituto Agronômico de Campinas. In: I Curso de Cafeicultura. 1954. Campinas: IAC, 1957.
ARRUDA, J. J. História moderna e contemporânea. São Paulo:Ática, 1974.
BORIN, J. Introdução ao estudo do café. São Paulo: LPM, 1971.
BRASIL. Ministério da Indústria e Comércio. IBC/GERCA (ed.). Cultura de café no Brasil: manual de recomendações. Rio de Janeiro, 1981.
Café conquista espaço no cerrado. Dirigente Rural, 19(10):55-64. 1980.
CAMARGO, R. de e TELLES Jr., A. de Q. O café no Brasil – sua aclimatação e industrialização. Rio de Janeiro: Ministério da Agricultura, 1953.
CARVALHO, A. Sistemática do gênero Coffea e descrição das variedades econômicas de C. arabica. In: I Curso de Cafeicultura 1954. Campinas:IAC, 1957.
CARVALHO, A., MONACO, L.C. e FAZUOLI, L.C. Melhoramento do cafeeiro. XL – estudos de progênies e híbridos de Café Catuaí. Bragantia, 38(22):201-216. 1979.
CASTRO, J.B. de. Café em cerrado do Alto Paranaíba, MG. Jornal “O Estado de São Paulo”. Suplemento Agrícola nº 1237. 21/02/1979, p. 3. 1979.
COMPANHIA DE DESENVOLVIMENTO DO PLANALTO CENTRAL (CODEPLAN). Anuário estatístico do Distrito Federal. Brasília:CODEPLAN, 1989.
CRUZ, G.L. Dicionário das plantas úteis do Brasil. Rio de Janeiro. DIFEL/Civilização Brasileira, 1982.
DEDECCA, D.M. Anatomia e desenvolvimento ontogenético de Coffea arabica L. var. cramer. Bragantia, 16(23):315-366. 1957.
HEISER Jr., C.B. Sementes para a civilização:a história da alimentação humana. São Paulo:Companhia Editora Nacional/EDUSP, 1977.
INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA. Censo Agropecuário 1995-1996 – Distrito Federal. Disponível em: http:// www.ibge.gov.br. Acesso em: 06.jun.2007.
JACQUES-FÉLIX, H. Le café. Paris:Presses Universitaires de France. 1968.
JOLY, A. B. e LEITÃO FILHO, H.F. Botânica econômica:as principais culturas brasileiras. São Paulo:EDUSP/HUCITEC, 1979.
KRUG, C.A., MENDES, J.E.T. e CARVALHO, A. Taxonomia de Coffea arabica L.:descrição de variedades e formas encontradas no Estado de São Paulo. Campinas:IAC, 1938.
LOBO, H. História econômica geral e do Brasil. São Paulo:Atlas, 1967.
MEDINA, E. Introducción a la ecofisiologia vegetal. Washington: OEA, 1977.
SÖNDAHL, M.R., CROCOMO, O.J. e SODEK, L. Measurements of 14C invorporation by illuminated intact leaves of coffee plants from gas mixtures containing 14CO2. Journal of Experimental Botany, 27(101):1187-1195, 1976.
TOURINHO, E. Breve história da formação econômica do Brasil. Rio de Janeiro:Pongetti, 1962.
sábado, junho 23, 2007
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