terça-feira, novembro 30, 2010

APONTAMENTOS SOBRE A FORMULAÇÃO E A GESTÃO DE POLÍTICAS PÚBLICAS

Paccelli José Maracci Zahler

1. Introdução

As políticas públicas podem ser conceituadas como “as ações do Estado no exercício de suas competências” (VECCHIA, 2010). Em outras palavras, são ações técnicas, planejadas para atingir dois objetivos – o bem-estar e a justiça social.
A formulação e a fundamentação de uma política pública envolvem conhecimentos de História, Ciência Política, Sociologia, Economia, Direito, Administração Pública, além de temas específicos onde o Estado atua como, por exemplo, Educação, Saúde e Segurança Pública. Cada um desses temas, por sua vez, irá apresentar uma série de problemas, os quais não serão solucionados isoladamente, havendo necessidade de participação popular. A razão disto se deve ao fato de as políticas públicas serem voltadas para o atendimento das necessidades básicas da população e para a promoção do bem-estar social.
Essa característica da política pública exige que o seu gestor tenha uma visão de conjunto, holística, somada à habilidade de realizar negociações e interligar os temas objetivando uma solução plausível.
Tratando-se de uma Prefeitura Municipal, por exemplo, o gestor público terá que conhecer o arcabouço legal pertinente ( a Constituição Federal, a Lei de Diretrizes Orçamentárias, a Lei Orçamentária Anual, a Lei de Responsabilidade Fiscal, a Lei das Licitações) e o funcionamento da máquina governamental para captar os recursos necessários para a implementação de um bom projeto de política pública.

2. O Plano de Governo

O principal instrumento pelo qual o gestor público irá nortear as suas ações no decorrer do seu mandato será o Plano de Governo.
O Plano de Governo deve trazer medidas concretas, fundamentadas, visando mudanças na sociedade, atendo-se às áreas estratégicas cujo atendimento tem sido feito de modo precário pelo Setor Público, isentando-se de promessas e compromissos eleitoreiros.
De uma maneira geral, o estrategista deve ter um conhecimento amplo das dificuldades enfrentadas pela população, cuja priorização de soluções serão determinadas pela disponibilidade de recursos orçamentários, devidamente aprovados pelo Poder Legislativo, seja ele municipal, estadual ou federal.
Para isso, o estrategista deve ouvir todos os interessados ou seus representantes, seja por meio de reuniões específicas ou seminários, não apenas para adequar as suas propostas às prioridades dos governados, como para antecipar-se às críticas e resistências ao que pretende implementar.
Pode lançar mão, também, de pesquisas de opinião encomendadas ou veiculadas pelos meios de comunicação. Por exemplo, na edição de 21 de novembro de 2010 do jornal Correio Braziliense, página 40, foi publicado o resultado de uma pesquisa realizada pelo Instituto FSB com 1.005 pessoas em todo o Distrito Federal, no período de 4 a 7 de novembro de 2010, em parceria com a empresa ZN Estatística, responsável pelo plano amostral, para saber quais os maiores desafios a serem enfrentados pelo governo eleito em 31 de outubro de 2010.
Segundo a pesquisa do Instituto FSB, 53,2 % dos entrevistados apontam a área de Saúde como o principal desafio do governo eleito do Distrito Federal, devido à falta de remédios, de equipamentos, de médicos; filas de espera para consultas, exames ou cirurgias; infecções hospitalares, falhas no atendimento e mortes por negligência.
A Segurança Pública foi o segundo desafio apontado, de acordo com 21% dos entrevistados. Destes, 75% afirmaram sentirem-se inseguros ou muito inseguros para andarem a pé, sozinhos, pelas ruas após as 22 horas, temendo assaltos à mão armada.
A Educação Pública foi citada por 6,1% dos entrevistados, ficando em terceiro lugar, seguida da Corrupção (4,8%) e Transporte Público (3,0%).
Esse diagnóstico certamente estará na pauta de discussão do novo administrador do Distrito Federal e será incorporado ao Plano de Governo para o período 2011-2014.
Por outro lado, uma coisa é elaborar um Plano de Governo, outra coisa é implementá-lo, pois toda a atividade administrativa pública sofre a influência e a pressão de grupos de interesse.
Geralmente, os grupos de interesse são ouvidos nas câmaras setoriais, cabendo ao administrador público compatibilizar as reivindicações com o Plano de Governo, desde que sejam viáveis e amparadas pela legislação em vigor. Todavia, dependendo da força política do grupo de interesse, seus anseios tendem a ser impostos à Administração Pública, em detrimento dos interesses da população em geral.
A conseqüência disso é a corrupção da Administração Pública onde alguns administradores-chaves passam a se preocupar em atender aos desejos dos grupos de interesses para se manterem nos cargos. Neste caso, passam a gastar mais em propaganda e na divulgação de sua administração, promovendo um culto à própria imagem com vistas à continuidade no poder. Desta maneira, deixam de fazer o que deve ser feito para permanecerem nos cargos. Por exemplo, as falácias de que o tempo de mandato não é suficiente para realizar determinadas melhorias que, muitas vezes, dependem de ações simples e individuais, como o cumprimento de horários de trabalho, interesse no que está fazendo, responsabilidade e respeito com o usuário do Serviço Público.
Assim, na elaboração de um Plano de Governo e seu detalhamento, além dos recursos financeiros, deve-se levar em conta o tempo disponível para sua execução.

3. A Importância dos Indicadores de Desempenho

Não basta elaborar um Plano de Governo sem a utilização de índices ou indicadores de desempenho que permitam avaliar se a execução está sendo realizada de acordo com o que foi planejado e se são necessárias correções e adequações para que o mesmo seja concluído no prazo estabelecido.
De acordo com Prado (1969), a estatística é um instrumento útil que permite analisar uma parte dos fenômenos em planificação, onde intervêm aspectos econômicos, sociais e políticos, com todas as suas interações. Por exemplo, propor uma certa distribuição de renda supõe que se conheça, com bastante detalhe quantitativo, a distribuição existente e a redistribuição desejada. Neste caso, um indicador de desempenho irá sinalizar se a renda está sendo redistribuída de fato e se o público-alvo está sendo beneficiado.
Isso evidencia a necessidade de obtenção de dados quantitativos e qualitativos, obtidos por meio de métodos estatísticos idôneos, resultando em um plano de longo prazo, viável e consistente. Tais dados devem ser utilizados de forma objetiva para não perder a visão central das metas propostas.
Mas o que vem a ser um número índice ou índice?
É um quociente que expressa uma dada quantidade em comparação a uma quantidade base, ou seja, são valores relativos tanto no tempo como no espaço, podendo ser utilizados em dois casos: quando se referem a um único produto ou serviço; ou quando se referem a um conjunto de produtos ou serviços (ENDO, 1988).
Porém, quando se quer avaliar um conjunto de produtos ou de serviços surge o problema de decidir qual número índice utilizar e se ele realmente mede o que se está querendo medir.
Segundo Frisch (1936), citado por Endo (1988), o problema do número-índice surge sempre que se deseja uma expressão quantitativa para um complexo composto de mensurações individuais para as quais não existe uma medida física comum.
Um exemplo disso pode ser encontrado na concessão de um reajuste nos benefícios do Bolsa Família, o maior programa social do atual governo do Partido dos Trabalhadores, e que atende a cerca de 12 milhões de famílias.
Na realidade, não existem mecanismos claros para a correção periódica dos benefícios e dos valores de renda que servem de referência para o ingresso e a manutenção dos beneficiários do programa, além do que isso somente pode ser feito por meio de decretos presidenciais, ficando sujeito a manipulações, principalmente em períodos eleitorais; ou ao congelamento dos valores por um longo tempo. Entretanto, se fosse criada uma linha oficial da pobreza no Brasil, os riscos poderiam ser eliminados, evitando crises. Atualmente, cada instituto ou pesquisador estabelece seu próprio critério de renda para demarcar quem é pobre e quem não é (MENDONÇA, 2010), gerando polêmicas sobre o assunto.
O exemplo acima evidencia a importância de se ter um número-índice adequado e confiável para a avaliação, a correção e o aperfeiçoamento de uma política pública a partir de avaliações periódicas da evolução, dos objetivos e das metas estabelecidas no decorrer do tempo.

4. Alguns desafios

O gestor público deve considerar, na formulação de uma política pública, a questão dos direitos humanos, ou seja, daqueles direitos que vão garantir as necessidades fundamentais da sociedade como a Educação, a Saúde, a Segurança Pública, a Alimentação, o Trabalho, o Saneamento, a Infra-estrutura. Entretanto, o que se vê na mídia é a inserção dos direitos pessoais e corporativos nas políticas públicas.
Diante desse quadro, pode-se inferir que os gestores públicos, na atualidade, estão preocupados em atender aos próprios interesses (aumentar o patrimônio, compensar o investimento feito na campanha política, empregar familiares e agregados, ampliar a conta bancária em paraísos fiscais) ou atender aos interesses de empresas que investiram na sua campanha política, permitindo que elas ganhem licitações dirigidas, continuem poluindo a natureza e pagando baixos salários aos empregados, porém, sonegando o pagamento dos impostos, que são fontes de recursos para os programas sociais.
Um exemplo recente dessa prática foi desvelada pela Operação Caixa de Pandora da Polícia Federal no Distrito Federal, onde gestores públicos, representantes do povo e aliados foram filmados enchendo bolsas, meias e vestimentas com maços de dinheiro oriundos do pagamento de propinas e de comissões oriundas da aprovação de empresas em licitações.
Em contraponto, a Revista Época, de 22 de maio de 2010, trouxe uma matéria nas páginas 106 a 109, intitulada “O País Mais Feliz do Mundo”, citando, como exemplo, a Dinamarca, onde as taxas de imposto de renda são altíssimas, mas as pessoas são “sorridentes, saudáveis e andam pelas ruas sem medo”, seguindo o preceito: “Você não é melhor que ninguém”.
Segundo a matéria, na Dinamarca há liberdade de expressão, os impostos ficam entre 50% e 70% da renda, porém, o Estado compensa isso com Segurança, Ensino Público gratuito, hospitais e acesso a especialistas.
O ensino básico é obrigatório e tem duração de dez anos. O ensino superior também é gratuito, graças à aplicação de 9% do PIB em Educação (o dobro do Brasil). Todos são fluentes em inglês, seu segundo idioma.
A Dinamarca aplica 20% do PIB na área de Saúde Pública. O Brasil, segundo estudo da Fundação Oswaldo Cruz, aplica em torno de 4 %.
As pessoas, a partir dos 65 anos, recebem uma pensão do Estado, mas podem trabalhar em horários adequados para a manutenção da saúde mental, sendo comum encontrar, por exemplo, guardas de museu com mais de 70 anos, trabalhando 10 dias por mês.
Voltando os olhos para o Brasil, pode-se verificar que os impostos também são altos. A carga tributária no Brasil corresponde, hoje, a 35 % do PIB, uma das mais altas do mundo, o que dificulta o crescimento da economia e a expansão dos negócios (ROCHA & LOYOLA, 2010). Para se ter uma idéia, em 1993, foi criado o Imposto Provisório sobre Movimentação Financeira (IPMF), mais tarde denominado de Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira (CPMF), a qual rendia cerca de R$ 40 bilhões anuais até 2007, quando foi extinta. Tais recursos deveriam ter sido aplicados na área de Saúde, mas tomaram outro destino. Assim, não é de se estranhar o mau atendimento à população no sistema público de saúde e, quem tem condições financeiras, acaba optando por um bom plano privado de saúde para evitar transtornos na hora que precisar de atendimento médico.
A mesma situação pode ser encontrada na área de Educação onde, quem deseja uma formação de qualidade, busca as escolas particulares ou escolas no exterior, muitas das quais com mensalidades mais baratas e com a vantagem de o aluno voltar dominando um segundo idioma.
O problema da Educação se agrava com a precariedade das escolas para pessoas especiais quais sejam disléxicos, cegos, surdos, mudos, com problemas motores e com síndrome de Down; assim como cursos profissionalizantes para jovens que desejam e necessitam entrar logo no mercado, bem como para presidiários.
Estes são os desafios mais urgentes que se somam à Segurança Pública, Infra-estrutura, Saneamento, temas que merecem uma atenção especial dos gestores públicos, cujos problemas são tratados e mostrados diariamente pela imprensa falada, escrita e televisada.

5. Conclusão

O tema da formulação e da gestão de políticas públicas é muito complexo e apresenta muitas idiossincrasias, porém, diante do exposto e dos exemplos apresentados, verifica-se a necessidade de planos, programas e projetos voltados para o atendimento das necessidades reais da população, as quais devem ser geridas em observância aos princípios básicos da Administração Pública que são: a legalidade, a moralidade, a impessoalidade, a publicidade, a transparência.
Apesar da complexidade da sua elaboração, se forem aplicados os princípios científicos de Administração Pública, com objetivos, metas e indicadores de desempenho representativos, será possível proporcionar mais qualidade de vida a uma população que para impostos em demasia, mas que, até o presente momento, não teve uma contrapartida justa por parte do Estado.

6. Bibliografia

ENDO, Seiti Kaneko. Números índices. São Paulo: Atual, 1988.
MADER, Helena. Saúde preocupa brasilienses. Jornal Correio Braziliense, 21 de novembro de 2010, p. 40.
MENDONÇA, Ricardo. Quem é pobre? Revista Época, nº 653, 22 de novembro de 2010, p. 52-53.
NOGUEIRA, Paulo. O país mais feliz do mundo. Revista Época, nº 627, 22 de maio de 2010.
PRADO, Arturo Nuñes Del. Estatística básica para planificação. Rio de Janeiro: Forum/ILPES, 1969.
ROCHA, Leonel & LOYOLA, Leandro. Dilma entre dois caminhos. Revista Época, nº 652, 15 de novembro de 2010, p. 52-54.
VECCHIA, Rosangela. O que são políticas públicas? Texto de referência. Escola de Formação Política Miguel Arraes, Fundação João Mangabeira. Brasília, 2010.

2 comentários:

Anônimo disse...

BRINCANDO COM COISA SÉRIA

A ARCA DE NOÉ E AS MUDANÇAS CLIMÁTICAS

Há muito anos atrás (período do Regime Militar), circulou um artigo que tinha como título “A Arca de Noé”.
Nele era contada uma pequena estória. Nela o planeta passava por uma fase muito complicada e, para resolvê-la, um tal Noé resolveu construir uma grande arca de modo a colocar um casal de cada ser vivo e, quando o dilúvio chegasse, este grupo sobreviveria para repovoar o planeta.
A estória evolui com a intervenção de um grupo de “iniciados” que aceitaram a idéia, mas consideraram que este era um empreendimento de grande porte e, desta forma, não poderia ser simplesmente conduzido por tal Noé. Seria necessário estruturar um empreendimento que pudesse conduzir a complexidade da construção da arca. Mudaram, de imediato, o nome do projeto que passou a se chamar “Arca das Mudanças Climáticas”.
Os “iniciados” começaram a estruturação do empreendimento: eleição de presidente, diretorias, assessorias, núcleos de pesquisa, contratação de especialistas, secretárias, motoristas, sede própria e sedes descentralizadas em diferentes locais do planeta, enfim, o imprescindível para que um grande empreendimento pudesse ser desenvolvido sem risco.
As tarefas foram divididas em vários Grupos de Trabalho, com reuniões realizadas não nas regiões do planeta onde eram inevitáveis os primeiros efeitos do dilúvio, mas sim em lugares aprazíveis onde os grupos pudessem trabalhar em condições adequadas a importância do projeto.
Inevitável, estes grupos acabaram se dividindo entre “prós e contras” e cada um deles, sem se preocupar com o dilúvio a caminho, resolveram ignorar a variável tempo, consumindo o tempo disponível em apresentar estudos e pesquisas que reforçassem as suas posições. Isso demandou uma grande quantidade de recursos, que foram logo disponibilizados pelos países mais ricos do planeta.
Surgiram especialistas, políticos especialistas, agentes de financiamento especialistas, centros de pesquisa especializados, típicos do entorno de operação de um grande empreendimento.
Sendo muito especializadas, de imediato a sociedade foi relegada a um segundo plano, dado que, na visão do projeto, apenas um casal de humanos, decidido que seria escolhido entre a alta direção do “Arca das Mudanças Climáticas”. Na verdade, logo no início, as informações foram passadas a sociedade, mas em linguagem complicada que levou a um progressivo afastamento do tema, deixando aos “iniciados” a discussão e decisão sobre o assunto.
E o tempo foi passando. Países que tinham “madeira” para a construção da arca tentaram impor condições ao andamento do projeto, mas foram logo afastados pelos países que “detinham a tecnologia do corte da madeira”, de modo a, progressivamente, ir reduzindo o tamanho do grupo dos “iniciados”. Foram observadas denúncias (“Arcagate”), mas, para os “não iniciados”, acabou ficando a dúvida de quem realmente tinha à razão.
Concluindo, passado alguns anos veio o aviso que o dilúvio seria no dia seguinte.
No empreendimento “Arca das Mudanças Climáticas” um desespero total; perdidos entre muitas alternativas não tinham tido tempo para concluir a arca. Ou seja, era inevitável que o dilúvio seria plenamente fatal para todos do planeta.
Mas, do alto da torre de trinta andares construída para fazer funcionar o mega projeto, no dia seguinte, quando a água quase cobria o edifício, foi possível ver uma arca de madeira, com os “não iniciados” liderados por um tal Noé, passando ao largo.
Você já pensou em que grupo está?
Ainda há tempo para escolher o grupo certo.

Roosevelt S. Fernandes, M. Sc.
Núcleo de Estudos em Percepção Ambiental / NEPA
roosevelt@ebrnet.com.br

Anônimo disse...

BRINCANDO COM COISA SÉRIA

A ARCA DE NOÉ E AS MUDANÇAS CLIMÁTICAS

Há muito anos atrás (período do Regime Militar), circulou um artigo que tinha como título “A Arca de Noé”.
Nele era contada uma pequena estória. Nela o planeta passava por uma fase muito complicada e, para resolvê-la, um tal Noé resolveu construir uma grande arca de modo a colocar um casal de cada ser vivo e, quando o dilúvio chegasse, este grupo sobreviveria para repovoar o planeta.
A estória evolui com a intervenção de um grupo de “iniciados” que aceitaram a idéia, mas consideraram que este era um empreendimento de grande porte e, desta forma, não poderia ser simplesmente conduzido por tal Noé. Seria necessário estruturar um empreendimento que pudesse conduzir a complexidade da construção da arca. Mudaram, de imediato, o nome do projeto que passou a se chamar “Arca das Mudanças Climáticas”.
Os “iniciados” começaram a estruturação do empreendimento: eleição de presidente, diretorias, assessorias, núcleos de pesquisa, contratação de especialistas, secretárias, motoristas, sede própria e sedes descentralizadas em diferentes locais do planeta, enfim, o imprescindível para que um grande empreendimento pudesse ser desenvolvido sem risco.
As tarefas foram divididas em vários Grupos de Trabalho, com reuniões realizadas não nas regiões do planeta onde eram inevitáveis os primeiros efeitos do dilúvio, mas sim em lugares aprazíveis onde os grupos pudessem trabalhar em condições adequadas a importância do projeto.
Inevitável, estes grupos acabaram se dividindo entre “prós e contras” e cada um deles, sem se preocupar com o dilúvio a caminho, resolveram ignorar a variável tempo, consumindo o tempo disponível em apresentar estudos e pesquisas que reforçassem as suas posições. Isso demandou uma grande quantidade de recursos, que foram logo disponibilizados pelos países mais ricos do planeta.
Surgiram especialistas, políticos especialistas, agentes de financiamento especialistas, centros de pesquisa especializados, típicos do entorno de operação de um grande empreendimento.
Sendo muito especializadas, de imediato a sociedade foi relegada a um segundo plano, dado que, na visão do projeto, apenas um casal de humanos, decidido que seria escolhido entre a alta direção do “Arca das Mudanças Climáticas”. Na verdade, logo no início, as informações foram passadas a sociedade, mas em linguagem complicada que levou a um progressivo afastamento do tema, deixando aos “iniciados” a discussão e decisão sobre o assunto.
E o tempo foi passando. Países que tinham “madeira” para a construção da arca tentaram impor condições ao andamento do projeto, mas foram logo afastados pelos países que “detinham a tecnologia do corte da madeira”, de modo a, progressivamente, ir reduzindo o tamanho do grupo dos “iniciados”. Foram observadas denúncias (“Arcagate”), mas, para os “não iniciados”, acabou ficando a dúvida de quem realmente tinha à razão.
Concluindo, passado alguns anos veio o aviso que o dilúvio seria no dia seguinte.
No empreendimento “Arca das Mudanças Climáticas” um desespero total; perdidos entre muitas alternativas não tinham tido tempo para concluir a arca. Ou seja, era inevitável que o dilúvio seria plenamente fatal para todos do planeta.
Mas, do alto da torre de trinta andares construída para fazer funcionar o mega projeto, no dia seguinte, quando a água quase cobria o edifício, foi possível ver uma arca de madeira, com os “não iniciados” liderados por um tal Noé, passando ao largo.
Você já pensou em que grupo está?
Ainda há tempo para escolher o grupo certo.

Roosevelt S. Fernandes, M. Sc.
Núcleo de Estudos em Percepção Ambiental / NEPA
roosevelt@ebrnet.com.br